“Piada maior que o 1º de abril de 64”. “A tendência é piorar”. “Temer, não durma tranquilo”. Essas foram algumas das palavras proferidas por atores, cineastas e produtores culturais sobre o fechamento do Ministério da Cultura pelo presidente interino Michel Temer neste histórico dia 12 de maio de 2016. O agora ex-ministro Juca Ferreira deixou uma mensagem de despedida em sua página oficial do Facebook: “eu fui feliz e sabia”. Leia na íntegra:
Enquanto isso, representantes da produção cultural se manifestaram contra a decisão, como relatou O Globo. Veja abaixo:
Aderbal Freire-Filho, diretor de teatro, autor e ator:
O fim do MinC é mais um golpe. Agora, contra a Cultura. Representa uma ponte para o passado. O MinC nasce com a redemocratização e agora acaba pela chegada de um governo ilegítimo. Como o Ministério da Educação, que atende a um universo enorme imenso (Enem, Prouni, entre tantos outros programas),ainda poderia incorporar as demandas da rica e variada cultura brasileira? Só tem um jeito: desprezando-a, sem dar a ela seu espaço e importância. O que não espanta. O que emerge agora é o o Brasil inculto, que despreza a sua arte. Mas a força atual da cultura brasileira vai reagir a esse ato obscurantista.
Wagner Moura, ator:
Já era de se esperar. Tem havido um movimento desonesto de convencimento público da desimportância da cultura e da criminalização dos artistas que fazem uso da Lei Rounet (que contraditoriamente é uma lei de viés neoliberal que estava sendo revista pelo Minc). A ideia de que o MinC e as leis de incentivo à Cultura não passam de uma maneira do governo sustentar artista vagabundo e comprar seu apoio político ganhou extraordinária e surpreendente aceitação popular. E como nos momentos de crise a cultura é a primeira que roda, o fim do MinC, sob a ótica do Estado enxuto e sob o entendimento popular de que artistas não passam de vagabundos que mamam nas tetas do Estado, infelizmente, não é uma surpresa. E a tendência é piorar.
José de Abreu, ator:
Solicitei ao governo francês um visto. Me deram um especial de residência chamado Competência e Talento com direito a trabalhar lá. Talvez por isso a Cultura na França movimente sete vezes mais dinheiro que a indústria automobilística. Aqui, o Temer quer acabar com a Cultura. Fechar o MinC mostra o período de trevas que começa nesta sexta-feira 13. Piada maior que o 1º de abril de 64.
Wolf Maya, diretor de TV e teatro:
Sinto que o nosso MinC que já ultrapassou a maior idade e que sempre teve uma representatividade importante no processo cultural brasileiro, nosso Ministério que representa e orgulha os criadores de cultura, possa voltar a ser uma Secretaria do MEC. Como tantas Secretarias Estaduais que foram perdendo a importância. É terrível!
Anna Muylaert, cineasta:
Em primeiro lugar, estou em estado de choque com tudo o que está acontecendo. O afastamento (da Dilma) é de 180 dias, o Michel Temer é um presidente interino. Acho ousado ele estar com essas transformações ministeriais todas prontas. No mínimo, deveria deixar a cadeira esfriar. Agora, as consequências dessa fusão depende de como o ministro vai pensar. Uma avaliação, neste momento, é algo prematuro. Porém, Educação e Cultura são coisas tão diferentes que, a princípio, me parece um retrocesso. Educação lida com formação, e Cultura tem relação com o povo, cultura mesmo. Olho com maus olhos.
Domingos Oliveira, diretor de teatro, dramaturgo e cineasta:
Para se viver em paz na sociedade é preciso saber que as pessoas são burras, muito burras. Quem não dá importância à cultura, que é a coleção do acervo pessoal da humanidade, sendo também o registro da sua brava passagem pelo planeta maravilhoso que logo se destruirá, é antes de tudo burro. Parece que não há limites para a grosseria e a estupidez dos nossos mandatários. Sua falta de espiritualidade, capaz de desvalorizar a cultura e a arte, que são nossas únicas chances de salvação nesse naufrágio agônico chamado Brasil, mostra apenas a velocidade de sua corrida em direção ao abismo. Temer, não durma tranquilo.
Cacá Diegues, cineasta:
Acho o fim do MinC um retrocesso histórico, uma incompreensão do que seja educação e cultura, de que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Simplificando, a educação prepara as pessoas para o mundo real, enquanto a cultura estimula a inventar outros mundos. Botar as duas coisas juntas, como se fossem uma coisa só, é um retrocesso acadêmico, uma incompreensão do mundo moderno e do futuro. Um retrocesso.
Fernando Meirelles, cineasta:
Todo mundo acha que o Brasil precisa diminuir o número de ministérios mas ninguém quer perder o “seu” ministério. Na cultura deve acontecer o mesmo. Imagino que meus colegas tenderão a não gostar da idéia. Não sei qual seria o plano e o que isso pode gerar de perdas para a produção cultural, mas me ocorre que para a educação, estar mais ligada a cultura pode ser interessante e há maiores chances disso acontecer se houver uma cabeça pensando ambas as áreas. Talvez nem seja tão bom para os produtores culturais mas se for bom para a educação, se alunos tiverem mais acesso a cultura, já estaria valendo. Vamos ver o que vem.
Walcyr Carrasco, autor:
Eu acho que o Ministério da Cultura não deveria perder sua autonomia. A Educação é importantíssima, e o MEC deve ter todos os seus esforços dirigidos para a educação, pois trata-se de uma grande lacuna no país. Mas é preciso também um projeto cultural, que estimule a expressão artística regional, inclusive. E para isso é preciso um Ministério da Cultura.
Mudanças
Junto ao anúncio oficial dos novos ministros — os 21 homens brancos de Temer — veio também a oficialização da extinção de nove ministérios. Além do fim do MinC, também foi decretado o fechamento do ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.
Na gestão de Temer, com o slogan “ordem e progresso”, duas áreas se juntam para formar o ministério da Educação e Cultura. O titular é o deputado Mendonça Filho (DEM/PE), ex-líder do partido na Câmara e um dos principais articuladores do processo de impeachment. Entre 1985 a 2007, o deputado foi filiado ao partido originário da Arena, de apoio à ditadura, o PFL.