Um público bastante animado compareceu ao Cine Encontro nesta terça-feira, 6 de outubro, para o debate que se seguiu à exibição de Califórnia, primeiro longa de ficção de Marina Person. Esse “filme de formação”, que se passa em 1984, narra as descobertas de Estela (Clara Gallo), uma adolescente que sonha em ir à Califórnia visitar o membro da família por quem nutre maior afinidade, seu tio Carlos (Caio Blat).
A diretora deu início ao bate-papo explicando à mediadora, a jornalista Kamille Viola, suas motivações para se dedicar ao projeto. “Eu tinha muita vontade de falar desse período e da minha geração, de mostrar como era ser adolescente num Brasil que tinha acabado de sair de vinte anos de ditadura, como era iniciar sua vida sexual quando uma doença fatal ligada ao sexo tinha acabado de ser descoberta, de falar de São Paulo nessa época”, explicou, lembrando que o filme tem muitos elementos autobiográficos. A trilha sonora, por exemplo, repleta de sucessos desse período: “São as músicas da minha vida, que fizeram a minha cabeça”, contou, relatando o difícil processo de negociação dos direitos dessas canções”.
Sobre a escolha do jovem elenco, Person disse ter buscado atores que não fossem muito experientes, informando ainda que a protagonista até então só havia trabalhado com teatro amador. “Eu queria trabalhar com esse frescor”, declarou. Quando a mediadora comentou que os membros mais jovens do elenco pareciam muito convicentes como adolescentes dos anos 1980, os atores Clara Gallo, Caio Horowicz e Giovanni Gallo confessaram que a preparação de elenco, a direção de arte e os figurinos foram fundamentais para que eles conseguissem adentrar com confiança esse novo universo. A protagonista chegou mesmo a admitir sua confusão inicial ao lidar com as fitas cassete: “A diretora de arte me ajudou”, esclareceu ela, rindo.
A esse respeito, Horowicz, que interpreta J.M., um menino apaixonado pelo pós-punk, acrescentou: “O quarto do J.M. me ajudou muito a entender o que se passava na cabeça dele”. Apesar da importância dessa ambientação, o ator ressaltou o caráter universal do enredo: “É um roteiro que também fala com a gente, fala com os jovens de hoje”, assegurou. Intérprete do tio Carlos, Caio Blat engrossou o coro de elogios aos profissionais responsáveis por direção de arte, figurino e caracterização.
A realizadora aproveitou ainda a oportunidade para falar um pouco sobre a condição da mulher no mercado cinematográfico, contando que em Califórnia todas as diferentes equipes eram chefiadas por mulheres. “Eu comecei a ver números recentemente: no último Festival de Veneza 13% dos filmes tinham sido dirigidos por mulheres, no de Toronto, 26%. É muito pouco, nós somos metade da população. Temos que repensar muitas coisas, incluindo as formas de representação das mulheres no cinema, que tipo de personagens a gente mostra”, afirmou. Tomando o gancho, Caio Blat se declarou um ator feminista, citando o grande número de trabalhos que tem feito em parceria com diretoras: “Ultimamente, eu só atuo em filmes de mulheres, é muito bom ser dirigido por elas. Eu já gosto de ser mandado por mulheres, então é mais fácil”, brincou.
Texto: Maria Caú, do Festival do Rio
Fotos: Lariza Lima