Em 31 de março de 1964 se deu início ao processo de derrubada do presidente João Goulart, Jango, eleito constitucionalmente. O golpe de Estado articulado pelo alto escalão do Exército, com apoio de representantes da sociedade civil, foi efetivado em 1º de abril. Esse momento é o marco inicial dos 21 anos de Ditadura Militar no Brasil, período em que cidadãos perderam o direito de se expressar livremente e de se posicionar sobre decisões políticas que afetaram diretamente suas vidas. Quem se opusesse, poderia sofrer graves retaliações psicológicas e físicas. São mais de duas décadas marcadas por censuras, perseguições, prisões políticas, exílios, torturas, desaparecimentos e assassinatos: todos crimes cometidos pelo Estado.
Falar sobre esse período nefasto da história, ainda muito recente, é crucial para compreender o Brasil e nortear a construção de uma sociedade mais livre, justa e democrática. Citando o mote da Comissão Nacional da Verdade, para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça, reúno nesta extensa lista filmes de ficção e documentários que propõem um olhar sobre a ditadura militar e suas sequelas.
Manhã Cinzenta (1968),de Olney São Paulo
Olney São Paulo dirigiu este média-metragem em plena vigência do AI-5. A história se passa numa ditadura fictícia na América Latina, onde um casal que participa de uma passeata é preso, torturado e interrogado por um robô. O filme foi censurado e tirado de circulação. Olney São Paulo foi preso e torturado. Ele não resistiu às sessões de tortura e foi morto pelo regime em 1978.
Hoje (2011), de Tata Amaral
“Vera (Denise Fraga) é uma ex-militante política que recebe uma indenização do estado brasileiro em decorrência do desaparecimento de seu marido, vítima da repressão provocada pela ditadura militar. Com o dinheiro, ela consegue comprar o tão sonhado apartamento próprio e, finalmente, ser reconhecida como viúva. No dia da mudança, recebe uma visita inesperada que altera sua vida”. No YouTube.
Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha
Eldorado, país fictício da América Latina, é palco de uma convulsão interna desencadeada pela luta em busca do poder. O escritor Paulo Martins (Jardel Filho) decide apoiar o centralizador Porfírio Diaz (Paulo Autran) em sua busca pelo comando. O filme foi indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes. No Telecine.
Amores de Chumbo (2018), de Tuca Siqueira
“Duas histórias de amor e três amantes. Sentimentos explodem após a descoberta de um segredo escondido por mais de 40 anos. Política e paixão revisitam o passado de ex-militantes políticos”. No Prime Vídeo.
Marighella (2019), de Wagner Moura
“Marighella (Seu Jorge) não teve tempo pra ter medo. De um lado, uma violenta ditadura militar. Do outro, uma esquerda intimidada. Cercado por guerrilheiros 30 anos mais novos e dispostos a reagir, o líder revolucionário escolheu a ação”.
Cabra Marcado Para Morrer (1984), de Eduardo Coutinho
O filme, que começou a ser produzido em fevereiro de 1964, deveria retratar a história do líder da liga camponesa de Sapé, na Paraíba, João Pedro Teixeira, assassinado em 1962. No entanto, com a efetivação do golpe militar, a locação no engenho da Galileia foi cercada e as filmagens interrompidas. Após 17 anos, Coutinho retornou à região e reencontrou a viúva de João Pedro, Elisabeth Teixeira (que até então vivia na clandestinidade) e tantos outros camponeses que participaram das gravações. Veja outros filmes do diretor.
Pra Frente, Brasil (1982), de Roberto Farias
Um pacato cidadão é tomado por terrorista e submetido a torturas. Enquanto isso, o Brasil vibra com os jogos da Copa do Mundo de 1970. No YouTube.
O Dia Que Durou 21 Anos (2012), de Camilo Tavares
“Documentos secretos e gravações originais da época mostram a influência do governo dos Estados Unidos no Golpe de Estado no Brasil em 1964. O filme destaca a participação da CIA e da própria Casa Branca na ação militar que deu início a ditadura”. No YouTube.
Histórias Que Nosso Cinema (Não) Contava (2017), de Fernanda Pessoa
Ainda no período da ditadura, nos anos 1970, as pornochanchadas, comédias sexuais, se tornaram o gênero mais visto e produzido no Brasil. A diretora realiza uma releitura história do país a partir de imagens e sons de 27 filmes da época. Na Netflix.
Jango (1984), de Silvio Tendler
O resgate da história política de João Goulart, 24° presidente brasileiro popularmente conhecido como Jango, deposto pelo golpe militar em 1964. A reconstituição é feita com imagens de arquivo e entrevistas com personalidades políticas, como Afonso Arinos, Leonel Brizola, Celso Furtado, Frei Betto e Magalhães Pinto. Veja outros filmes do diretor. No YouTube.
Narciso em Férias (2020), de Ricardo Calil e Renato Terra
O cantor e compositor Caetano Veloso faz um relato íntimo de sua experiência em cárcere durante a Ditadura Militar em 1968. Sua fala contempla desde a aparição dos policiais em sua casa em São Paulo poucos dias depois do AI-5 ser decretado até sua soltura e retorno a Salvador. O filme foi exibido fora de competição no Festival de Veneza 2020 e qualificado para o Oscar 2021. No GloboPlay.
Tatuagem (2013), de Hilton Lacerda
“Recife, anos 70. Em meio à ditadura, o soldado Fininha (Jesuíta Barbosa) vive um romance tórrido com Clécio (Irandhir Santos), o líder de um ousado grupo de teatro”. Inspirado na realização artística de Jomard Muniz de Britto e o grupo teatral Vivencial Diversiones, tema do episódio três do podcast do Assiste Brasil. Na Netflix.
Deslembro (2018), de Flávia Castro
“Joana (Jeanne Boudier) é uma adolescente que mora em Paris com a família. Quando a anistia é decretada no Brasil, ela volta ao Rio de Janeiro, cidade onde nasceu e onde seu pai desapareceu nos porões do DOPS. Lá, seu passado ressurge”. No Telecine.
Blablablá (1968), de Andrea Tonacci
“Um ditador num momento de uma grave crise nacional, institucional, confrontando na cidade e no campo por revoltas e guerrilha, na busca de uma paz ilusória, faz um longo pronunciamento pela televisão. Mas a realidade impõe-se à sua ficção e o controle da situação escapa-lhe das mãos. Sobra-lhe uma patética confissão antes de ser tirado do ar”. No YouTube e Vimeo.
Torre (2017), de Nádia Mangolini
Quatro irmãos, filhos de Virgílio Gomes da Silva, o primeiro desaparecido político da ditadura militar brasileira, relatam suas infâncias durante o regime. Assista no Vimeo: https://vimeo.com/235665294
Vou Contar Para os Meus Filhos (2012), de Tuca Siqueira
“Entre os anos de 1969 e 1979, 24 jovens mulheres estiveram presas na Colônia Penal Feminina do Bom Pastor, em Recife (PE), porque lutavam por igualdade social e pela democracia em uma época em que o Brasil enfrentava uma ditadura militar. Passados 40 anos, o reencontro delas, que hoje moram em diferentes estados do país, traz de volta não apenas os laços de solidariedade que surgiram no presídio, mas também a lembrança de um Brasil que tentou calar vozes e violentar sonhos”. Curta-metragem disponível no YouTube.
Retratos de Identificação (2014), de Anita Leandro
“Dois ex-guerrilheiros que lutaram contra a ditadura militar se deparam, pela primeira vez, com fotografias tiradas pela polícia no momento de suas respectivas prisões. Espinosa testemunha sobre o assassinato de seu amigo Chael Schreier, sob tortura, e Guarany relembra a vida no exílio, sem documentos, e o suicídio de sua companheira, Maria Auxiliadora Lara Barcellos, em Berlim. O passado retorna”. Assista no Vimeo: https://vimeo.com/110206302
Em Nome da América (2017), de Fernando Weller
“Entre os anos 1960 e 1980, o Peace Corps (Corpos da Paz) enviou ao Brasil centenas de jovens americanos, como parte de um projeto do governo estadunidense de solidariedade e luta contra a pobreza. Por meio de testemunhos, vasto material de arquivo e documentação histórica, Em nome da América revela o projeto como uma política internacional que visava a minar a influência comunista no Nordeste do Brasil, representada pelas Ligas Camponesas”. No YouTube e Google Play Filmes.
Libelu – Abaixo a Ditadura (2020), de Diógenes Muniz
O documentário reconstitui a história do grupo Liberdade e Luta, reconhecido por retomar a palavra de ordem “abaixo a ditadura” nas manifestações dos anos 1970. Além de entrevistas com políticos, jornalistas e outras personalidades, o diretor apresenta imagens de arquivo localizadas no acervo da Cinemateca Brasileira. Vencedor do Festival É Tudo Verdade 2020 e um dos documentários brasileiros qualificados para o Oscar 2021. Estreia adiada para maio devido ao agravamento da pandemia.
Fico Te Devendo Uma Carta Sobre o Brasil (2019), de Carol Benjamin
Menção honrosa no Festival É Tudo Verdade 2020, o documentário retoma três gerações de uma família atravessada pela Ditadura Militar e investiga a persistência do silêncio como ferramenta de apagamento da memória. Também foi qualificado para o Oscar 2021. No GloboPlay.
Diário de Uma Busca (2010), de Flávia Castro
Celso Castro, jornalista com uma longa história de militância de esquerda, é encontrado morto no apartamento de um ex-oficial nazista em 1984. A diretora, filha de Celso, reconstrói a história da vida e morte dessa figura singular. Retrato íntimo de uma relação marcada pela história e pela ausência. No Looke/Prime Video.
Que Bom Te Ver Viva (1989), de Lúcia Murat
Murat, que foi torturada no período da ditadura militar, reúne neste filme a experiência de oito ex-presas políticas que viveram situações semelhantes. A narrativa mistura delírios e fantasias de uma personagem anônima (Irene Ravache) aos depoimentos das entrevistadas. No Prime Video e Spcine Play (gratuito).
Torre das Donzelas (2018), de Susanna Lira
“Quarenta anos após serem presas durante a ditadura militar na Torre das Donzelas, como era chamada a penitenciária feminina, ao lado da ex-presidente da República Dilma Rousseff, um grupo de mulheres revisita a sua história”. No GNT.doc.
A Mesa Vermelha (2013), de Tuca Siqueira
Depoimentos de 23 ex-presos políticos que compreende o período da ditadura militar no Recife entre 1969, com a promulgação do AI-5, e 1979, com o advento da Lei da Anistia. Os personagens do documentário, ao redor de uma mesa vermelha, falam da Guerrilha do Araguaia, pela luta dentro das prisões em prol da anistia ampla, geral e irrestrita até a conjuntura atual. Gratuito no site do documentário.
Aurora 1964 (2017), de Diego Di Niglio
“Um país em plena crise de sua democracia, marcado por conflitos políticos e sociais, é o pano de fundo das narrativas do cotidiano desses e de outros personagens que tiveram a vida atingida pelo regime militar instalado com o golpe de 1964. Aurora 1964 é um exercício de memória, que constrói pontes entre épocas da história brasileira dos séculos XX e XXI. E ́ um registro sobre vidas recompostas, constituídas por desvios e atravessadas pela imprevisibilidade das dinâmicas políticas do presente e do passado”. Um dos entrevistados do documentário é Jomard Muniz de Britto, filósofo, diretor, escritor, tropicalista e um dos nomes mais importantes do Ciclo Super-8 em Recife (ouça o podcast e leia a matéria sobre sua obra). Assista no Vimeo: bit.ly/aurora64
O Assiste Brasil é uma iniciativa jornalística independente e você pode apoiar o site de diversas maneiras. Conheça nosso podcast e o Correio de Cinema.