Maria Bonita, Verônica, Suely, Francisca, Karla, Alaíde, Jovelina e Sargento Selma. Todas essas mulheres em uma só: Hermila Guedes. De Cabrobó, interior de Pernambuco, a jovem tímida que sonhava ser guia de turismo foi conduzida pelo destino e levada aos palcos dos teatros. Mas foi no cinema que Hermila se consagrou como atriz. Em 2000, aos 20 anos de idade, recebeu seu primeiro prêmio de melhor atriz no 4º Festival de Cinema de Recife e no 10º Cine Ceará pela participação no curta-metragem O Pedido, de Adelina Pontual.
Daquele momento em diante, a atriz não parou mais e já coleciona prêmios de diversas categorias do audiovisual. Seja no teatro, no cinema ou até mesmo na TV, Hermila encanta com sua forma carismática e intensa de atuar, levando ao espectador todo encanto do universo lúdico do “ser atriz”.
Você estudou Turismo e Letras na UFPE e chegou até mesmo a trabalhar em agências de viagens. Como foi que descobriu que queria se tornar atriz?
Entrei num grupo para fazer teatro porque poderia ajudar o meu desempenho ao lidar com público. Sou uma pessoa muito tímida e pensava mesmo era seguir carreira como guia de turismo. Mas, como os trabalhos na área de arte foram aparecendo com mais frequência, fui fazendo e começando a gostar. Acabei me apaixonando pela profissão, mas confesso que até hoje, vez ou outra, duvido da minha vocação.
E a transição dos palcos para o cinema? Como aconteceu?
Estava ensaiando a minha primeira peça de teatro e fiz dois testes para o curta O Pedido, dirigido por Adelina Pontual. Por surpresa, passei. Foi o meu primeiro trabalho profissional — primeiro no cinema e primeiro na vida. Depois dele não parei mais e venho sempre desempenhando papéis importantes para minha vida profissional.
Quais as dificuldades para quem deseja entrar no mercado profissional das artes dramáticas com foco no cinema?
Hoje o cinema no Brasil é o sonho de consumo de todo ator e eles não estão pensando apenas no filmes, mas nos diretores e produtores que querem trabalhar. Acho que aí está a dificuldade: na concorrência. A televisão não é mais a única vitrine, e o cinema tem uma linguagem própria, fascinante. O ator tem a chance de viver processos, criar personagens mais densas. Isso o atrai, já que ele tem tempo de fazer melhor seu trabalho e dar o melhor de si na produção.
É fácil ser atriz em Pernambuco?
Não, mas já foi mais difícil, quando não tínhamos esse cinema tão forte. Fazer um filme em Pernambuco já abre muitas portas no mercado fora do estado. A visibilidade do trabalho realizado em Pernambuco já é grande nos festivais brasileiros, que também estão crescendo, e até mesmo em festivais do exterior. O ator é um dos profissionais que se beneficia com isso.
E como você avalia esse crescimento estrondoso e a qualidade do cinema produzido em Pernambuco atualmente?
Acho que devido à originalidade e diversidade das histórias contadas nos nossos filmes, atrelado ao nosso potencial, tanto de equipe, diretores e elenco, o cinema pernambucano vem ganhando visibilidade nacional e internacional. Nosso cinema consegue encher os olhos pela forma poética, verdadeira e bela que é produzido e isso foge do tradicional. Vejo que há um tempo esse estilo vem inspirando produções no Brasil. Temos grandes diretores, que inclusive estão abrindo portas para uma geração cheia de ideias, conceitos e criatividade. Acredito que muita coisa boa vem por aí. Vida longa a esse importante momento do cinema pernambucano!
Qual o diferencial das produções pernambucanas em relação às demais em que já atuou?
Temos uma maneira muito própria de fazer cinema aqui em Pernambuco. Fazemos filmes com poucos recursos e nem por isso eles deixam de ser belos, grandes. Nos apegamos a sonhos, desejamos vida longa e uma jornada feliz daquele trabalho. Acho que arriscamos mais e o resultado é de que cada trabalho feito aqui é único. Confesso que viciei nessa forma de trabalhar do cinema pernambucano.
Cinema, Aspirinas e Urubus (2005), Baixio das Bestas (2007), Assalto ao Banco Central (2011) e Era uma Vez Eu, Verônica (2012) são alguns dos grandes filmes de seu currículo. Como você analisa seu crescimento profissional ao longo dessa jornada?
Acredito que não ter passado por processos acadêmicos fez com que me apegasse à prática. Eu realmente aprendi fazendo. E é lógico que tive muita sorte de encontrar grandes diretores e generosos colegas de trabalho por esses anos afora, que ajudaram bastante no meu crescimento profissional. Todos em especial me fizeram ser a atriz que hoje sou. Tenho certeza de que cada trabalho aconteceu no tempo certo, reforçando a fluidez das minhas escolhas.
E quanto aos diretores com que trabalhou? O que cada um adicionou a sua carreira?
Tudo. Eu sou uma atriz obediente e amo ser dirigida. Cada diretor e cada trabalho foram e são bem especiais para mim. Cada um com sua forma de dirigir, eles foram moldando em mim a forma desejada para cada trabalho. Claro que tenho os meus prediletos, mas acredito que isso seja justificado pelo tempo que estive junto e pela maneira como fui conduzida.
Você é uma atriz que não para de produzir e já interpretou diversas personagens. Qual foi a mais difícil de fazer?
Difícil para mim é fazer uma personagem que não gosto e isso não teve até agora. Fiz boas escolhas, me entreguei igualmente a todos os trabalhos sem nenhum pudor ou julgamento. Claro que não se ganha sempre, mas fico feliz com a repercussão de todos.
Quais atores você destacaria como referência?
Posso citar Geninha da Rosa Borges, por quem tenho muito carinho e também por ser um marco em minha carreira — meu primeiro trabalho no cinema foi com ela. A atriz Laura Cardoso é outra que amo e que, embora nunca tenha contracenado com ela, me identifico bastante com a forma que constrói suas personagens. E os maiores atores do cinema no Brasil hoje são muito especiais para mim: João Miguel e Irhandir Santos. São generosos demais e aprendi muito com eles.
Qual filme nacional te marcou e o que você gosta de assistir no cinema?
Estômago, principalmente pela atuação de João Miguel. Também gosto muito de Cinema, Aspirinas e Urubus por sua poesia sem igual. Pouco vou ao cinema, prefiro ver filmes em casa. Sou um pouco obcecada, gosto de ficar atenta ao elenco, principalmente à atuação. Vejo o filme mais de uma vez e também fico revendo as cenas que gosto para não perder nenhum segundo e apreciar aquele momento.
Entrevista realizada por Uhélio Gonçalves.